segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

A imortalidade humana – parte 4 – Um certo Benjamin Button do mundo animal

Para encerrar de vez esse assunto de imortalidade vou falar de um dos casos mais fantásticos de seres capazes de viver por tempo indefinido. Quem assistiu ao filme “O Curioso Caso de Benjamin Button” viu a história de um sujeito que nasceu velho e foi ficando jovem até morrer na fase de bebê, apresentando um ciclo de vida reverso e fora do comum. Na vida real tem um animal capaz de seguir um ciclo semelhante, a diferença é que o seu ciclo é contínuo, o que o mantém vivo por tempo indefinido. Trata-se de uma água-viva da espécie das Turritopsis dohrnii.


Turritopsis dohrnii (Fonte: skekoa)

As águas-vivas ou medusas são criaturas extremamente prolíficas. Elas podem ser encontradas em todos os oceanos do mundo e permanecer em ambientes que vão desde baías rasas do Havaí até as águas profundas do mar da Fossa das Marianas, no Oceano Pacífico.

Fossa das Marianas - Um dos lugares mais profundos do oceano, também habitado por medusas (Fonte: eco4u)
Nos últimos anos, houve o contato crescente entre humanos e medusas em virtude do rápido aumento das populações de muitas espécies de águas-vivas diferentes. Este fator levou à progressiva expansão de pesquisas sobre o ciclo de vida dessas criaturas fascinantes do mar e, conseqüentemente, levou a uma série de descobertas surpreendentes. Como as águas-vivas continuam a aumentar em número, os biólogos descobriram que uma das razões para as suas populações se expandirem em progressão geométrica pode ser o fato de que algumas espécies simplesmente não morrem!


População de águas-vivas capturadas por pescadores (Fonte: oceanografiaonline)

Assim como outros organismos, as espécies mais conhecidas de águas-vivas têm um ciclo de vida muito linear. De acordo com um artigo criado pelo Departamento de Recursos Naturais da Carolina do Sul, Estados Unidos, as medusas começam como uma larva chamada de plânula pelágica, de forma oval e completamente ciliada que se desenvolve como medusa, em algumas espécies. Uma vez separada da mãe, passa algum tempo flutuando na superfície da água antes de se fixar em uma superfície dura como uma rocha ou um casco de um navio. Depois disso, elas atingem o estado de pólipo, onde permanecem estacionárias, e continuam se alimentando de organismos microscópicos e se reproduzindo assexuadamente, até formar uma colônia de pólipos idênticos, cada um recebendo alimentação igual, através de minúsculos tubos de alimentação interligados. Nessa fase, incrivelmente, a água-viva pode permanecer como pólipo por tempo indefinido, às vezes esperando anos ou mesmo décadas até possuir condições para se metamorfosear para a próxima fase de desenvolvimento. Quando essas condições ideais finalmente chegam, as colônias de pólipos liberam gomos de si mesmo durante a reprodução e esses gomos se fixam em outros substratos ou iniciam um processo conhecido como estrobilação, onde eles se dividem em discos sobrepostos que se libertam como larvas pelágicas chamadas de éfiras. Dessa forma as éfiras darão origem a novas medusas sexuadas. Durante a reprodução sexual, as águas vivas liberarão na água os óvulos e os espermatozóides, e assim começará o processo de fertilização.


Dra Maria Pia Miglietta (Fonte: oceanexplorer)

Por volta de 1883, foi descoberta no mar Mediterrâneo uma nova espécie de água-viva, a Turritopsis dohrnii, a quem atualmente é atribuída a característica de imortal, pois, diferente das demais medusas, essa possui um ciclo de vida peculiar que pode ajudar cientistas como a Dra. Maria Pia Miglietta, do Smithsonian Tropical Marine Institute a explicar porque algumas espécies desses animais estão literalmente assumindo os oceanos do planeta. Miglietta descobriu que, ao contrário de outras espécies, a Turritopsis dohrnii tem a estranha capacidade de reverter o seu desenvolvimento em tempos de crise. Por exemplo, se estiver em perigo de morrer de fome ou tenha sofrido uma lesão com risco de morte, esta espécie particular de água-viva é capaz de reverter todas as suas células vivas para um estado mais jovem, mais flexível, através de um processo chamado de transdiferenciação. Durante este processo, a água-viva primeiro transforma-se em quisto globular, em seguida, o cisto se reverte em uma colônia de pólipos. Esta é basicamente a primeira fase de sua vida e daí ela é capaz de reiniciar todo o seu processo de vida, criando novas réplicas que estão livres dos males causados às réplicas anteriores e refazendo posteriormente o processo de transdiferenciação, num ciclo sem fim.


O processo de transdiferenciação (Fonte: scienceblogs)

Como já foi dito em artigos anteriores, já existem estudos sobre a viabilidade de criação de novas células em seres humanos, para substituir aquelas que já estão danificadas, com o intuito de criar um indivíduo imortal. Alguns biólogos, como Stefano Piraino, da Universidade de Salento, estão otimistas de que esta água-viva possa um dia ajudar a livrar o mundo do câncer e outras doenças mortais. Sua esperança está enraizada no fato de que, assim como as células cancerosas, algumas das células da Turritopsis dohrnii são capazes de seletivamente ativar certos genes ligados ou desligados para permitir que os programas genéticos que estavam presentes em fases anteriores possam ser reativados.


superpopulação de águas-vivas (Fonte: memycamelandi)

Se os investigadores puderem ter uma melhor compreensão destas medusas e conseguirem desvendar o segredo por trás daquilo que as permitem passar por uma transformação tão radical na estrutura celular e nas suas funções vitais, isso não só ajudaria a preservar a vida marinha ameaçada de extinção e que está sendo prejudicada pela invasão de águas-vivas, como pode abrir as portas para uma classe inteiramente nova de tratamentos médicos que podem um dia ajudar a eliminar alguns dos males mais persistentes da humanidade.


            A imortalidade humana – parte 1 – Um sonho cada vez mais real


            A imortalidade humana – parte 2 - A sociedade dos imortais


            A imortalidade humana – parte 3 – Os imortais do mundo animal e vegetal

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